terça-feira, julho 31, 2007

Ausênsia


AUSÊNCIA


Num deserto sem água


Numa noite sem lua


Num país sem nome


Ou numa terra nua


Por maior que seja o desespero


Nenhuma ausência é mais funda do que a tua.



Sophia de Mello Breyner Andresen

sábado, julho 28, 2007

ACM


OBITUARIO CON HURRAS

Mario Benedetti (poeta progressista uruguaio)

Vamos a festejarlo,vengan todos!

los inocentes

los damnificados

los que gritan de noche

los que sueñan de día

los que sufren el cuerpo

los que alojan fantasmas

los que pisan descalzos

los que blasfeman y arden

los pobres congelados

los que quieren a alguien

los que nunca se olvidan.

Vamos a festejarlo,vengan todos!

el crápula se ha muerto

se acabó el alma negra

el ladrónel cochino

se acabó para siempre

Hurra!que vengan todos!

vamos a festejarlo

a no decir

la muerte siempre lo borra todo

todo lo purifica

cualquier día la muerte

no borra nada

quedan siempre las cicatrices.

Hurra!murió el cretino

vamos a festejarloa no llorar de vicio

que lloren sus igualesy se traguen sus lágrimas

se acabó el monstruo prócer

se acabó para siempre

vamos a festejarlo

a no ponernos tibios

a no creer que éste

es un muerto cualquier

avamos a festejarlo

a no volvernos flojosa no olvidar que éste...


ES UN MUERTO DE MIERDA.



"Na luta de classes, todas as armas são boas: pedras, noites e poemas" - Paulo Leminski



Recebi de uma amiga, achei que as palavras estão bem ditas, o sentimento bem colocado.

Mas ...eu não festejo não.

Prefiro dar graças...

Nise

Fogo Branco


Solidão.

Tu tens o meu nome

Encerrado em teu baú.

Sabes que meu olhar é baço

Como a vidraça espancada pela chuva.

Envolta no lençol branco do silêncio

A chama da vela apaga aos poucos

E a imagem do Outro

Funde-se ao Nada


Marília Kubota

segunda-feira, julho 23, 2007

Estrela do Mar

De Repente
Olho-te espantado:
Tu és uma Estrela do Mar.
Um minério estranho.
Não sei...No entanto,
O livro que eu lesse,
O livro na mão,
Era sempre teu seio!
Tu estavas no morno da grama,
Na polpa saborosa do pão...
Mas agora encheram-se de sombra os cântaros
E só o meu cavalo pasta na solidão.

Mário Quintana

Poeminha


Poeminho do Contra



Todos esses que aí estão

Atravancando meu caminho,

Eles passarão...

Eu passarinho!




Mário Quintana

Os Poemas


Os poemas

Os poemas são pássaros que chegam

não se sabe de onde e pousam

no livro que lês.

Quando fechas o livro, eles alçam vôo

como de um alçapão.

Eles não têm pouso

nem porto

alimentam-se um instante em cada par de mãos

e partem.

E olhas, então, essas tuas mãos vazias,no maravilhoso espanto de saberes

que o alimento deles já estava em ti...
Mário Quintana

Tigrão


Teu riso acorda meu riso adormecido, esquecido de ser feliz.
Teu riso , meu tigrão, acalma a fúria da onça vovó, enche de ternura meus dias, na pureza, no amor incondicional, do desconhecimento das mazelas da vida que fazem o coração rugir de fúria para não arrebentar de dor.
Menino Caetano Tigrão, eu te amo!
Vovó (onça) Nise
São Gabriel, 23 de julho de 2007.

domingo, julho 22, 2007

Lamparina


Há uma lamparina entre as flores.
Porque não há lamparina
em meu cego coração?
Nise
São Gabriel, 22 de julho de 2007

Lei Maria da Penha



17/07/2007 - CrimeViolência doméstica é combatida em São Gabriel Por: Jorn. Marco Aurélio Nunes ( ascom@mp.rs.gov.br)

Imagem:sol.sapo.pt


Ivana Battaglin
Lei Maria da Penha está permitindo providências mais enérgicas e imediatas na comunidade situada na região da fronteira oeste A Lei Maria da Penha, sancionada em 7 de agosto do ano passado e que traz mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, tem gerado efeitos práticos em São Gabriel. O motorista Arlei dos Santos Cruz, 29, que estava proibido pela Justiça de aproximar-se da companheira a uma distância mínima de mil metros, em razão de agressão anterior, acabou preso nesta semana. A prisão preventiva foi decretada pelo juiz José Pedro de Oliveira Eckert, que atendeu ao pedido do Ministério Público. Arlei desobedeceu medidas protetivas anteriormente deferidas à sua companheira.
Com este caso subiu para quatro o número de agressores que tiveram suas prisões solicitadas à Justiça de São Gabriel como forma de proteger mulheres vítimas da violência em seu próprio lar.
PREVENTIVA
O que chama atenção na nova lei, se comparada às normas que anteriormente eram aplicadas em caso de violência doméstica, é a efetiva possibilidade de que as autoridades ligadas à segurança, assim como o Ministério Público e o Poder Judiciário, “tomem providências enérgicas e imediatas”, diz a promotora de Justiça Ivana Machado Battaglin. A principal mudança trazida com a Lei 11.340/06, “é a possibilidade de se decretar prisão preventiva para crimes menos graves, tais como ameaça e lesão de natureza leve, por exemplo, o que antes não era permitido pela legislação”, destaca.
MEDIDAS
A Promotora de Justiça que atua na comunidade de São Gabriel sublinha que a lei prevê que já na Delegacia de Polícia a vítima pode solicitar “medidas urgentes para resguardar sua integridade física e de sua família, caso o autor dos fatos não seja preso”, podendo, inclusive, solicitar ao Juiz que fixe alimentos provisionais para a prole, determine o afastamento do agressor do lar, dentre outras providências. A lei também faculta que a própria Polícia acompanhe a vítima até sua residência para retirar seus pertences do local, se assim entender necessário.
ALTERAÇÃO
Outra alteração importante que a lei trouxe, comenta Ivana Battaglin, foi a “impossibilidade” de se aplicar alguns benefícios aos seus autores como a transação penal (prestação de serviços à comunidade ou pagamento de cestas básicas), nem a suspensão condicional do processo. Se denunciados, os autores de crimes praticados contra mulheres, no âmbito doméstico ou familiar, “terão de responder a todo o processo criminal, até a sentença final”.
AUDIÊNCIA
No entanto, para que se possibilite a reconciliação entre autor e vítima, ou mesmo para que se decida amigavelmente algumas questões relativas à guarda dos filhos, direito de visitas, pensão alimentícia, dentre outros, Ivana falou que a Vara Criminal de São Gabriel tem designado audiências para tentativa de conciliação entre as partes, em que é “imprescindível o comparecimento da vítima, acompanhada de advogado ou Defensor Público”. Isso porque, “se ela não mais deseja que o autor do fato seja processado, deve dizer isso na presença do Juiz, pois essa formalidade é exigida na Lei”. É importante que a mulher vítima de violência doméstica compareça a essa audiência, porque sua ausência “fará com que o autor do fato seja processado e a vítima não mais poderá se arrepender ou se retratar”, explica a Promotora de Justiça.
Tenho imenso orgulho de ti, minha filha.
Mãe

sexta-feira, julho 20, 2007

Rosto Lavado

Rosto lavado

Hoje aniversario.
Sei a data de meu nascimento
Sei onde , quando e quanto pus sentimento
Sei das perdas, agradeço os ganhos
Sei exatamente a idade que tenho
Resta agora ensinar meu coração
A contar o tempo.


Nise
São Gabriel,20 de julho de 2007.

quinta-feira, julho 19, 2007

Sophia de Mello Breyner Andresen


Data

Tempo de solidão e de incerteza

Tempo de medo e tempo de traição

Tempo de injustiça e de vileza

Tempo de negação

Tempo de covardia e tempo de ira

Tempo de mascarada e de mentira

Tempo de escravidão

Tempo dos coniventes sem cadastro

Tempo de silêncio e de mordaça

Tempo onde o sangue não tem rasto

Tempo da ameaça

Desastre Tam


A vida é efêmera, um sopro. Bela, basta um instante, um ar, um pisar, uma decisão,um acidente.
Vivemos , sem pensar mais do que vida. Os muito religiosos no conforto de outra vida, ou no desespero do eterno fogo.
De verdade somos flor de algodão, brincamos de eternidade, vivemos na brisa mansa de dias e dias que parecem para sempre nossos.
Claro que no fundo, muito fundo inconsciente, nos sabemos frágeis, perecíveis, nos despedindo quando brindamos cada novo dia.
O acidente com o vôo da Tam, apenas nos desperta desse devaneio de eternidade para o horror da morte antecipada, dos desastres rondando a vida, trazendo a morte.
Todos morreremos. Humanas criaturas, esperamos o conforto familiar, a despedida triste mas acompanhada, as vezes até um adeus feliz de quem viveu e participou da festa da Vida.
Quando eu morrer quero teus olhos nos meus, quero meus filhos me perpetuando numa memória feliz que eu possa deixar do que fui.
Tenho PIEDADE de todas as vítimas. Desse acidente, de outros mais; como nascer e morrer na miséria, viver no meio de conflitos e guerras do mais ganancioso e cruel governo.
Tenho PIEDADE, dos que nascem na desigualdade, morrem ainda pior.
Tenho PIEDADE dos atormentados, dos que refletem a vida, escutam música mas nunca aprenderam a dançar.
Tenho imensa PIEDADE de quem perde sua herança maior,perde sua continuidade, seus filhos, sua certeza de perenidade.
Tenho PIEDADE de todos nós.
Não há culpa na catátrofe, nem a fúria insana e vingativa traz conforto.Um pouco de adrenalina talvez, um momento. Depois o inevitável vazio.
PIEDADE para quem fez a viagem definitiva tão fora do tempo, sem aviso prévio, sem esperança.
PIEDADE para os que ficaram para sempre enfurnados na caverna da saudade, onde só responde o próprio eco de seus gritos de dor.
PIEDADE para todos capazes de sentir a dor alheia, na compreensão de que a dor faz ronda enquanto a felicidade ainda é possível.
Nise
São Gabriel, 19 de julho de 2007





quarta-feira, julho 18, 2007

Ternura


Ternura

Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentado
Pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma...
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade o olhar extático da aurora.
Vinícius de Moraes

Sophia


A minha pátria é onde o vento passa,

A minha amada é onde os roseirais dão flor,

O meu desejo é o rastro que fica das aves,

E nunca acordo deste sonho e nunca durmo


Sophia de Mello Breyner Andresen

segunda-feira, julho 16, 2007

Neruda



O Poço
Cais, às vezes, afundas em teu fosso de silêncio,
em teu abismo de orgulhosa cólera,
e mal consegues voltar,
trazendo restos do que achaste pelas profunduras da tua existência.
Meu amor, o que encontras em teu poço fechado?
Algas, pântanos, rochas?
O que vês, de olhos cegos, rancorosa e ferida?
Não acharás, amor,
no poço em que cais o que na altura guardo para ti:
um ramo de jasmins todo orvalhado, um beijo mais profundo que esse abismo.
Não me temas, não caias de novo em teu rancor.
Sacode a minha palavra que te veio ferir e deixa que ela voe pela janela aberta.
Ela voltará a ferir-me sem que tu a dirijas,
porque foi carregada com um instante duro
e esse instante será desarmado em meu peito.
Radiosa me sorri se minha boca fere.
Não sou um pastor doce como em contos de fadas,
mas um lenhador que comparte contigo terras,
vento e espinhos das montanhas.
Dá-me amor, me sorri e me ajuda a ser bom.
Não te firas em mim, seria inútil,
não me firas a mim porque te feres.
Pablo Neruda

Uma Rosa


UMA ROSA
Abrem-se ainda tardes como lagos
pálidos sobre os tectos d'ouro,
leve tremendo na quieta luza ãnsia derramada das árvores.
E não há mais memória ou pranto: só
um mover d'olhos no coração que acorda
do seu sono de pedra e te revê,
claro fulgor de vida, maravilha
revelada e secreta da vida
que vive.
E o céu é céu.
Uma rosa se abriu em qualquer ponto
do mundo e inebria todo o ar
do ocaso que se expande sobre o mundo.
DIEGO VALERI(1887-1976)
O céu é o céu.Vida continua vida.As rosas continuam abrindo, o aroma revelado em cada sentido do apreciar flôres, quando no cotidiano somos rosas impiedosamente esmagadas.
Mas , esmagadas, ainda exalamos perfume.
Nise

sábado, julho 14, 2007

Presidente Lula, meu respeito!





Jogos Pan-Americanos
A vaia do Rio de Janeiro branco
DAVIS COIMBRA/ Enviado Especial/Rio

A vaia do Maracanã ao presidente Lula foi maciça, foi pesada e foi humilhante. Mas há um aspecto nessa vaia que não se pode deixar passar: foi a vaia do Rio de Janeiro branco. Onde estavam os negros na linda festa do maior templo do esporte mundial? Onde estavam os pobres que todos os dias atormentam os motoristas nos sinais de trânsito, esmolam nas esquinas, balançam nos trens e nos ônibus lotados? Quem atravessou a cidade da Barra da Tijuca ao Maracanã viu onde eles estavam: nas favelas pingentes, nas malocas infectas, vivendo no fedor do mangue, entre balas perdidas e papagaios empinados.Isso não desmerece nem desautoriza a vaia do Maracanã. Os bem nascidos e bem alimentados também têm direito à vaia, e foram 90 mil bem nascidos e bem alimentados que vaiaram o presidente. Mas foram, sim, os bem nascidos, os bem alimentados.Eu estava no Maracanã. Eu vi: eram todos limpos, corados, vestidos de acordo com a moda, caminhando sorridentes com seus filhos pela mão. Repito: não havia pobres no Maracanã. E repito: isso não torna a vaia menor. Mas isso deixa exposta a maior chaga do Brasil. O Brasil são dois: o Brasil branco, que trabalha, ri, se diverte e protagoniza uma festa tão magnífica como a de ontem. E o Brasil que vive à margem, subnutrido, revoltado, muitas vezes de fuzil na mão, como nas favelas do Rio.Lula veio deste Brasil. Do Brasil negro. Provavelmente mereceu a vaia. Mas quem o vaiou vem de um lugar do qual ele jamais pertenceu. E talvez tenha sido esse o motivo de ter sido a vaia tão maciça, tão pesada, tão humilhante.



Sr Presidente Lula,

sinto imenso orgulho de ser brasileira, uma graça infinda, nasci gaúcha, e desde seu primeiro mandato como presidente, mais razões tenho para orgulhar-me.

O povo se fez ouvir, e finalmente elegeu gente como nós, que pensa e é nossa voz.(saiu uma rima que rima com prima, gente,presidente,esperança,confiança.)
Sei que o sr presidente sabe-se maior que essa manifestação de uma minoria que está aprendendo, sem gostar, a repartir o pão.
Meu respeito,
Nise (uma cidadã)

sexta-feira, julho 13, 2007

Meu coração é um albergue...




Eu adoro todas as coisas


E o meu coração é um albergue aberto toda a noite.


Tenho pela vida um interesse ávido


Que busca compreendê-la sentindo-a muito.


Amo tudo, animo tudo, empresto humildade a tudo,


Aos homens e às pedras, às almas e às máquinas,


Para aumentar com isso minha personalidade.




Pertenço a tudo para pertencer cada vez mais a mim próprio


E a minha ambição era trazer o universo ao colo


Como uma criança a quem a ama beija.


Eu amo a todas as coisas, umas mais que as outras,


Não nehuma mais do que outra, mas sempre mais as que estou vendo


Do as que vi ou verei


Nada para mim é tão belo como o movimento e as sensações.


A vida é uma grande feira e tudo são barracos e saltimbancos.


Penso nisso, enterneço-me mas não sossego nunca.



Dá-me lírios, lírios

E rosas também.


Dá-me rosas, rosas,

E lírios também,


Crisântemos, dálias,

Violetas e os girassóis


Acima de todas as flôres...



Deita-me às mancheias,

Por cima da alma,

Dá-me rosas, rosas

E lírios também...


Meu coração chora

Na sombra dos parques,

Não tem quem o console,

Verdadeiramente,

Exceto a própria sombra dos parques

Entrando-me na alma,

Através do pranto.

Dá-me rosas, rosas,

E lírios também...



Minha dor é velha

Como um frasco de essência, cheio de pó.


Fernando Pessoa



"...minha dor é velha/como um frasco de essência cheio de pó."

Mas renovadas, sempre diferentes , intercaladas por riso , ternura. Senão como sobreviveria eu?

Não sou de ferro não...muito menos meu coração.

Nise.

São Gabriel, 14 de julho de 2007.

quinta-feira, julho 12, 2007

Amigas

Vou te visitarPosted by Picasa
a saudade de nossas conversas não chegou de mansinho...não! Assaltou-me de forma perigosa para meu então, despreparado coração.
Vou visitar-te.
Na certeza de teu riso feliz, do abraço carinhoso, de ser mais uma vez benvinda.
Tenho muitos motivos para dar graças.
Hoje, dou por ti.
Amiga muito querida Cenira, sejam os dias que passaram, uma trilha para os que virão...pois o implacável tempo ensina que de verdade, é a amizade o sentimento mais verdadeiro, mais fiel.
Tua amiga Nise, que chamas Nicce...mas já me acostumei e gosto.

Vida


A vida deu-me muito mais do que eu queria, mas não me deu o que pedi.









Nise
São Gabriel, 12 de julho de 2007

NPosted by Picasa

quarta-feira, julho 11, 2007

Se tanto me dói que as coisas passem



Se tanto me dói que as coisas passem

É porque cada instante em mim foi vivo

Na busca de um bem definitivo

Em que as coisas de Amor se eternizassem

Sophia de Mello Breyner Andresen


Liberdade

Liberdade

Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade
Sophia de Mello Breyner Andresen

Conto para Laura


No tempo que acreditávamos poder explicar o que sem explicação é, caminhos tortuosos mas encantados de ternura de teu pai, morreu Leoa, a cachorra doberman, filha da Preta.
Antes, bem antes, quando estava próximo o nascimento de Flora, Preta foi embora. Disse o Gringo que ela sabia a hora certa de sair...
Na ocasião, debaixo de um cinamomo, perto da janela foi enterrada. Da janela do quarto de teu pai, amorosamente colocada, suspiro doído de lembrar.
Eras pequena e amavas cada animalzinho, principalmente os da chácara, que te guardavam.
Quando Leoa partiu, foi difícil compreenderes a ausênsia definitiva. Mais uma vez, teu pai (repartindo a saudade, buscando consolar-te) criou uma estória bonita, quem dera fosse mesmo assim!
"-Sabe Laura, agora Leoa vive no céu"
Refletistes a idéia, acho que amenizou por um tempo tua saudade.
Uma noite, de mãos com teu pai, lá fora entre árvores, terra e céu, fizestes um pedido:
-Pai , me ajuda subir no galho mais alto, quero esticar os braços, tocar Leoa com minhas mãos.
Tocar estrelas!!!
Hoje posso te dizer "porque vivi" que as estrelas mais inatingíveis são aquelas que muito perto, ignoram nosso coração.
Menina querida, há estrelas em teu olhar, brilho em tua vida, muita beleza que orgulha essa tia que mesmo distante nunca deixou de te amar.
Tia Ivanise

terça-feira, julho 10, 2007

Quando as crianças brincam





Quando as crianças brincam


E eu as oiço brincar,


Qualquer coisa em minha alma


Começa a se alegrar.


E toda aquela infância


Que não tive me vem,


Numa onda de alegria


Que não foi de ninguém.


Se quem fui é enigma,


E quem serei visão,


Quem sou ao menos sinta


Isto no coração.




Fernando Pessoa

Rosa


É um pássaro,

é uma rosa,

é o mar que me acorda?

Pássaro ou rosa ou mar,

tudo é ardor,

tudo é amor.

Acordar é ser rosa na rosa,

canto na ave,

água no mar



Eugenio de Andrade

Borboletas


Passa uma borboleta por diante de mim e pela primeira vez no Universo eu reparo que as borboletas não têm cor nem movimento, assim como as flores não têm perfume nem cor. A cor é que tem cor nas asas da borboleta, no movimento da borboleta o movimento é que se move, o perfume é que tem perfume no perfume da flor. A borboleta é apenas borboleta e a flor é apenas flor. Fernando Pessoa -Alberto Caeiro
Do blog " o voo das borboletas"

Tempo de Resgatar


...era bonito cantar, trovar, mas bem que diziam: tempo não é, senhores, de inocência, nem de ternuras vãs, nem de cantigas, diziam e eu não sabia que a coisa ia ser comigo, entendes? E o mundo parecia cheio de graça (...) mas o tempo não está para graças...
(Fluxofloema - Hilda Hilst)

Um gato chamado gatinho





"O gato é uma maquininha que a natureza inventou
tem pêlo, bigode, unhas e dentro tem um motor.
Mas um motor diferente desses que tem nos bonecos
porque o motor do gato não é um motor elétrico.
É um motor afetivo que bate em seu coração
por isso ele faz ron-ron, para mostrar gratidão.
No passado se dizia que esse ron-ron tão doce
era causa de alergia pra quem sofria de tosse.
Tudo bobagem, despeito, calúnias contra o bichinho:
esse ron-ron em seu peito não é doença - é carinho". (Ferreira Gullar - Um gato chamado Gatinho)
Veludo, Peter, Chico, Maiakóviski, Neruda,Quintana, agora Lily e Fígaro...
Todos carinho, revividos em cada outro gatinho.
Nise

Fado


Não sei, não sabe ninguém

Por que canto o fado

Neste tom magoado

De dor e de pranto

E neste tormento

Todo o sofrimento

Eu sinto que a alma

Cá dentro se acalma

Nos versos que canto

Foi Deus

Que deu luz aos olhos

Perfumou as rosas

Deu oiro ao sol

E prata ao luar

Foi Deus que me pôs no peito

Um rosário de penas

Que vou desfiando

E choro a cantar

E pôs as estrelas no céu

E fez o espaço sem fim

Deu o luto às andorinhas

Ai, e deu-me esta voz a mim

Se canto

Não sei o que canto

Misto de ventura

Saudade ternura

E talvez amor

Mas sei que cantando

Sinto o mesmo quando

Se tem um desgosto

E o pranto no rosto

Nos deixa melhor

Foi Deus

Que deu voz ao vento

Luz ao firmamento

E deu o azul às ondas do mar

Foi Deus

Que me pôs no peito

Um rosário de penas

Que vou desfiando

E choro a cantar

Fez poeta o rouxinol

Pôs no campo o alecrim

Deu as flores à primavera

Ai, e deu-me esta voz a mim



(Foi Deus - Alberto Janes)


Fado que te quero tanto, fado acalentando pranto!

Nise

Sophia


Alguém diz:
"Aqui antigamente houve roseiras" Então as horas Afastam-se estrangeiras, Como se o tempo fosse feito de demoras.
Sophia de Mello Breyner Andresen

Peito Vazio


Peito Vazio
Cartola e Elton Medeiros
Nada consigo fazer
Quando a saudade aperta
Foge-me a inspiração
Sinto a alma deserta
Um vazio se faz em meu peito
E de fato eu sinto
Em meu peito um vazio
Me faltando as tuas carícias
As noites são longas
E eu sinto mais frio.
Procuro afogar no álcool
A tua lembrança
Mas noto que é ridícula
A minha vingança
Vou seguir os conselhos
De amigos
E garanto que não beberei
Nunca mais
E com o tempo
Essa imensa saudade que sinto
Se esvai
Do blog "Coração Selvagem".
Lembro sempre que " ...solidão é, na boca ,uma frase ausente, no peito, um espaço em branco."
José Larralde
A compreensão do muito , quando penso nada, me faz viver bem mais feliz.
Nise

segunda-feira, julho 09, 2007

Teatral







Teatral
Cintia Souza Kaneyuki












Rasguei retratos enquanto você dormia
deslizei por becos em suas mão frias
sem linhas, sem destino que se acredite existir
apenas me despedi dentre papéis em branco
deixados em sua cama, caricatura
do sem seus dias de drama
a sua novela preferida
foi me deixar partir para depois sucumbir
suas lágrimas em minha porta...
volta
retorna a seu palco vistoso
cheio de luz e magia
que nossas mentiras não me assustam mais
fantasmas sempre se calam
quando deixamos de acreditar
lembranças sempre se apagam
quando temos mais o que fazer
e por mais que as ruas insistam
em atrair nossos opostos
atravesso a cidade para com você não colidir
por hoje ao menos
só me deixe partir...



Escolha

Escolha



Elisa Lucinda




Eu te amo como um colibri resistente incansável beija-flor que sou

batedora renitente de asas

viciada no mel que me dás depois que atravesso o deserto.

Pingas na minha boca umas gotas poucas

do que nem é uma vacina.



Eu uma mulher, uma ave, uma menina

Assim chacinas o meu tempo de eremita:

quebras a bengala onde me apoiei, rasgas minhas meias
as que vestiram meus pés

quando caminhei as areias.

Eu te amo como quem esquece tudo

diante de um beijo:
as inúmeras horas desbeijadas

os terríveis desabraçosos dolorosos desencaixes

que meu corpo sofreu longe do seu.

Elejo sempre o encontro

Ele é o ponto do crochê.

Penélope invertida

nada começo de novo

nada desmancho

nada volto

Teço um novo tecido de amor eterno

a cada olhar seu de afeto

não ligo para nada que doeu.

Só para o que deixou de doer tenho olhos.

Cega do infortúnio

pesco os peixes dos nossos encaixes

pesco as gozadas

as confissões de amor

as palavras fundas de prazer

as esculturas astecas que nos fixam

na história dos dias

Eu te amo

.De todos os nossos montes

fico com as encostas

De todas as nossas indagações

fico com as respostas

De todas as nossas destilairias

fico com as alegrias

De todos os nossos natais

fico com as bonecas

De todos os nossos cardumes

as moquecas.

domingo, julho 08, 2007

Corridinho


Corridinho

Adélia Prado

O amor quer abraçar e não pode.
A multidão em volta,com seus olhos cediços,
põe caco de vidro no muro
para o amor desistir.
O amor usa o correio,o correio trapaceia,
a carta não chega,
o amor fica sem saber se é ou não é.
O amor pega o cavalo,
desembarca do trem,
chega na porta cansado
de tanto caminhar a pé.
Fala a palavra açucena,pede água, bebe café,
dorme na sua presença,
chupa bala de hortelã.
Tudo manha, truque, engenho:
é descuidar, o amor te pega,te come, te molha todo.
Mas água o amor não é.